Encalhado desde 1967, navio que participou da Segunda Guerra Mundial segue resistindo ao tempo na costa gaúcha e se torna ponto de curiosidade e contemplação
Entre o
silêncio das dunas e o som insistente das ondas do litoral norte gaúcho, há um
pedaço da Segunda Guerra Mundial que repousa esquecido — ou quase — na areia.
Fragmentos do Mount Athos, um antigo navio mercante de bandeira liberiana,
ainda podem ser vistos em uma praia desolada entre o Farol da Solidão, em
Mostardas, e o balneário de Quintão.
A embarcação,
que já foi chamada de Fort Orange e participou da histórica invasão à Normandia
em 1944, encontrou seu destino final no Rio Grande do Sul, no dia 11 de março
de 1967, após encalhar em um banco de areia a menos de 100 metros da costa.
Um fim
enigmático para um veterano de guerra
O navio partira
de Tampa, na Flórida, com destino ao Brasil, carregando adubo. Já havia
atracado em Vitória (ES) e no Rio de Janeiro. Seu próximo destino era Rio
Grande, seguido por Porto Alegre. Mas, em meio à cerração e à madrugada, o
capitão Loudaros se perdeu, acreditando estar em alto-mar.
Quando se deu
conta, o Mount Athos estava preso num banco de areia — e com sérios riscos de
partir ao meio. O porão dianteiro já era invadido pela água, e a pressão das
ondas ameaçava romper a embarcação. Uma balsa salva-vidas apareceu na praia de
Quintão, sem ninguém a bordo, aumentando o mistério. A versão oficial do
capitão foi de que a balsa fora lançada ao mar para pedir socorro.
A operação
de resgate que virou notícia nacional
O episódio
mobilizou autoridades: a Capitania dos Portos de Rio Grande, a Polícia do
Exército e equipes da Defesa Civil. Montaram barracas na praia. A corveta
Angostura foi enviada, mas surpreendentemente recebeu ordens para retornar a
Rio Grande — o capitão não aceitou o tipo de resgate, que geraria custos.
Dias depois,
com a situação se agravando, a embarcação recebeu dois rebocadores e
assistência de uma empresa especializada. Mesmo assim, o navio não cedia. Vinte
dos 29 tripulantes foram levados ao Hotel Farol, em Cidreira. Os outros,
incluindo o capitão, permaneceram a bordo, na esperança de uma solução que
nunca chegou.
A comoção dos
marinheiros ao tocarem o solo gaúcho virou manchete. O caso, amplamente
noticiado pelo Diário de Notícias, foi descrito como uma corrida contra o
tempo. Até mesmo saques foram registrados, com sete pessoas detidas — o que
levou à abertura de inquérito pela Marinha para apurar possíveis contrabandos.
Um gigante
de aço com muitas identidades
Antes de ser
chamado Mount Athos, o navio teve outros nomes e donos. Construído nos Estados
Unidos em 1943, foi batizado de Tobias Lear, com 134,5 metros de comprimento e
peso bruto de 7,1 mil toneladas. Repassado aos holandeses no mesmo ano, foi
renomeado Fort Orange, e, em 1944, participou da Operação Overlord, levando
material militar para os Aliados na Normandia.
Após a
guerra, o navio foi rebatizado como Blijdendyk, depois Transilvânia, até
receber o nome final em 1965, ao ser adquirido por uma empresa com sede em
Monróvia, na Libéria.
Um ponto
turístico para aventureiros e curiosos
Hoje, o
esqueleto do Mount Athos jaz quase esquecido entre o mar e as dunas, resistindo
ao tempo, à maresia e ao isolamento. O local só é acessível com veículos 4x4 ou
em longas caminhadas pela faixa de areia. A ausência de estruturas turísticas
faz com que a visita ao local seja também um mergulho em silêncio, solidão e
reflexão.
Apesar das dificuldades de
acesso, o local atrai fotógrafos, historiadores amadores e aventureiros que se
encantam com a aura misteriosa do navio. Entre a Solidão e o Quintão, um
capítulo pouco conhecido da Segunda Guerra repousa, corroído, mas não vencido.
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